O Estatuto da Terra completa neste dia 30 de novembro de 2011 os seus 47 anos de existência. Ele surgiu praticamente oito meses após a instalação no Brasil do Governo Militar e há correntes que afirmam: a Lei 4.504 de 30 de novembro de 1964, promulgada pelo então presidente da República Humberto de Alencar Castello Branco, surgiu para aquietar o campo.
Há, sim, fundamento nesta tese, mas o que deve ser considerado é que se o propósito foi o de manipulação, o documento, por outro lado, contém avanços que só não se concretizaram porque deixaram de ser cumpridos pelo próprio regime militar de 64 e governo posteriores. Há de se considerar, também, que desde que o Estatuto foi criado, somente em anos recentes a tentativa de estabelecer justiça a partir da lei foi manifestada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o seu 2º Plano Nacional de Reforma Agrária. A prática, da mesma forma, não passou da incipiência.
Na época da promulgação as lutas e as reivindicações do campo eram marcantes, herdadas de um período de descontentamentos insuflados no governo João Goulart. O que se exigia eram mudanças estruturais na propriedade e no uso da terra.
Assim, o Estatuto da Terra trouxe em seu artigo 16 que “a reforma agrária visa estabelecer um sistema de relações entre o homem, a propriedade rural e o uso da terra, capaz de promover a justiça social, o progresso e o bem-estar do trabalhador rural e o desenvolvimento econômico do País, com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio”.
Em tese, portanto, o propósito é nobre. Lembremos que em 1988 a Constituição Federal que entrou em vigor estabeleceu, em seu artigo 5º. Incisos 22 e 23, o direito de propriedade condicionado ao atendimento da sua função social.
Outro detalhe a ser mencionado é que a reforma agrária não se limita à redistribuição da terra. É preciso vir acompanhada de políticas públicas de apoio à produção, comercialização, educação, saúde, habitação, ação social e, enfim, inclusive de suporte tecnológico que a população rural precisa neste mundo de comunicação virtual. Isto é papel do poder público das diferentes esferas, mas como é comum no Brasil, somente acontece se determinada por lei.
Convenhamos: há experiências interessantes e promissoras em algumas regiões do Paraná onde famílias foram beneficiadas com módulos rurais. Organizadas em cooperativas, elas se sustentam na produção e na comercialização. A base ideológica nestas localidades é sólida, o que comprova que a organização social sedimentada na política é necessária. Claro, não estamos nos referindo à política partidária. Esta política é aquela que aflora da consciência sobretudo em relação à busca da cidadania e da justiça.
E aqui nos cabe mencionar que quando o partidarismo se manifestou influente em algumas mobilizações pela conquista da terra, infelizmente a vitória foi seguida de uma passividade que inviabilizou projetos. Do tipo: tenho a terra, o que faço com ela agora?
O momento atual é de desatenção do poder público em relação à questão agrária e ao campo em geral. Nem a produção comercial em grande escala preocupa as autoridades. E o risco que esse desprezo governamental representa para os brasileiros é de uma crise na produção de alimentos em curto espaço de tempo.
Os sinais de um desacerto já são dramáticos. Numa compra de supermercado a família brasileira não tem explicação sobre o aumento quase que diário de gêneros de primeira necessidade. A carne encarece assustadoramente. O leite e os derivados tornam-se inviáveis. Folhas, legumes e verduras tornam-se produtos sujeitos à variação de preços de acordo com o humor da natureza. Isso mostra que não há política para a agropecuária. Faltam projetos e programas para o momento. E o que se dirá do futuro?