segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Passivos vamos permitir que eles nos tripudiem

Teríamos que ter a Lei da Ficha Limpa se os políticos fossem isentos de acusações de desvios? A transparência, em vez de lei, não devia ser uma prática corriqueira do poder público? Sim e sim. O problema é que, infelizmente, estamos trabalhando com a utopia. Como também provocaríamos outra pergunta e teríamos uma resposta presumivelmente única: haveria necessidades de transformar o Brasil na República das Cotas caso o acesso ao ensino superior, ao mercado de trabalho e, enfim, a um padrão de vida digno fosse um leque aberto em 180 graus? Esta foi uma pegadinha, pois a resposta utópica seria não.

Utopia, o que significa isso? Vejam que estamos exagerando nas perguntas, quando o texto, no entender de alguns analistas, deveria responder. Mas cá as indagações são necessárias, uma vez que não somos doutores em nada e queremos entender as coisas como cidadãos iguais a todos os cidadãos. Podemos entender a utopia como aquilo que consideramos ideal. Em termos de civilidade, o que é bom para todos, contempla a todos e dá oportunidade a todos, por exemplo.

Mas de tão utópica a utopia ganha outras definições complementares nos dicionários de sinônimos. Alguns trazem que a utopia é a busca do fantástico e do imaginário. Assim, querer um bom emprego com salário suficiente para sustentar a família em condição de conforto e segurança financeira seria uma utopia? Quase. O absurdo seria perguntar: ganhar a vida sem ter que recorrer à Lei da Vantagem seria utopia? Infelizmente muitos cidadãos brasileiros a praticam, depois de assimilarem que sem usar do jeitinho brasileiro o indivíduo morre de inanição, esquecido pela Previdência Social e desprezado pelos vizinhos e ignorado pelos políticos.

A Lei da Vantagem a que nos referimos é aquela injustamente vinculada ao jogador Gerson. No auge da carreira ele estrelou uma peça publicitária que tinha como mote a frase “gosto de levar vantagem em tudo”.

Frase, aliás, extraída de uma característica que ele tinha como jogador de futebol, mas adaptada na publicidade como oportunismo. Por isso as práticas políticas de se sobrepor à lei e à ordem para enriquecer, como o costume brasileiro de encurtar o caminho para chegar antes, foram vinculadas ao Gerson. E a Lei de Gerson virou sinônimo de oportunismo do mal.

Mal, no entanto, para quem jura nunca na vida ter usado de vantagens para abreviar o tempo de espera numa consulta porque o parente do parente trabalha no posto de saúde, ou evitar a fila do banco porque o primo do cunhado trabalha no caixa. Vamos, atirem a primeira pedra: quem nunca usou a Lei do Gerson?

Caso mais da metade dos leitores tenham respondido que nunca caíram do trilho, vamos combater o sistema de cota, a lei da transparência, a fiscalização dos benefícios e dizer, com altivez, que neste país não precisamos da lei da ficha limpa. Indignados, vamos gritar que lei com tal propósito é uma ofensa para os políticos e os eleitores brasileiros.

Como não é assim, considerando que brasileiro nem fila de supermercado respeita, vamos lutar por mais leis e fazer de conta que, algemados na legislação somos, sim, politicamente corretos.

Embora provocativa e incorreta, esta última parte vale como um cutucão em cada um de nós. Pois ter políticos retos, não depender de legislação para garantir direitos iguais a todos e poder confiar na justiça e no poder público com os olhos fechados depende unicamente de nós. Eles nada farão que nos ajudem nisso.

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