quinta-feira, 29 de março de 2012

Dominante e dominado na prova do concurso

Classe dominante e classe dominada! Faz tempo não ouvíamos e nem líamos nada sobre isso. É bom lembrar, no entanto, que esse termo foi muito usado no Brasil do período militar. E a gente, quando remetido para aqueles anos, recupera na memória a cara rechonchuda do então ministro Delfin Neto. No mundo a classe dominante nos remete aos debates de outrora sobre o marxismo, que a chamava de burguesia no sistema capitalista. Enfim, era a classe social que controlava o processo econômico e político.

Controlava? Na verdade nunca perdeu o controle, apenas assumiu novas denominações usando dos mesmo artifícios: a exploração econômica, política e cultural, o que inclui o trabalho, a oportunidade de renda, o acesso ao ensino de qualidade, o lazer, a possibilidade de vida social, a saúde e tudo o que faz parte do cotidiano do povinho.

Recente concurso realizado pela Fundação de Apoio à Educação, Pesquisa e Desenvolvimento Científico e Tecnológico da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (Funtef-Pr) para a Prefeitura de Cambé mostra claramente que a classe dominante está firme e forte e como no passado ainda hoje age descaradamente contra a classe dominada.

Na prova para as vagas de gari cerca de meia dúzia de questões relacionadas à conhecimentos gerais reflete este embate. Uma pergunta é sobre o nome de uma atriz de novela da Globo. Outra é sobre frase que caracteriza uma personagem de humor de programa da Globo. Uma questão chama o recém-falecido jogador de futebol Sócrates de libertário. E assim vai, invocando dupla sertaneja que aparece frequentemente no Domingão do Faustão ou o nome da música que consagrou um tal de Michel Teló, que nem fazemos questão de conferir se escrevemos o nome correto porque não faz diferença.

Cultura geral é isso, para a equipe que elaborou estas perguntas. E não se pode exigir mais conhecimento que isso para um candidato a vaga de gari porque o risco é desse trabalhador, sendo aprovado ou não, adquirir cultura de verdade após estudar para o concurso. Cultura, enfim, é um direito adquirido da classe dominante. A classe dominada não pode saber mais do que as fococas e as vulgaridades.

E vejam a que ponto chegamos! Somos obrigados a tratar a cultura com subdivisões: cultura de verdade. Isso significa que pode haver cultura de mentira. E não estamos falando de contra cultura. Estamos nos referindo a este empreendedorismo vergonhoso de ser contra a cultura para as pessoas que não tem acesso a ela.

Isso se faz assim mesmo. Tratando quem não tem recursos para assistir a um bom espetáculo de teatro ou música como pessoas burras e dando a ela mais incentivo para assistir o BBB do Pedro Bial e pagar caro para se espremer no Parque Ney Braga enquanto um meia boca canta no recinto de shows.

E porque Sócrates foi libertário? O jogador, que também era médico, lutou pelos profissionais do futebol. Por isso foi respeitado como atleta e como líder. Libertário é um termo jocoso e provocativo. Sócrates não foi libertário. Ele foi um líder.

Nunca, na verdade, tivemos a ilusão de que esta guerra fria da classe dominante contra a classe dominada tivesse chegado ao fim. Mas em determinados momentos caímos na ilusão e aceitamos passivamente que os patrões chamassem os empregados de parceiros ou colaboradores. Também engolimos durante toda a nossa vida, como se aquilo fosse doce e degustável, aquele gasto discurso: o trabalho enobrece. Concordamos! Mas quem é que é o enobrecido?

Em governos mais recentes, depois do milagre brasileiro de Delfin e dos militares, Collor de Melo implantou o neoliberalismo caipira e perverso. Henrique Cardoso inventou outro neoliberalismo e além da privatização desvairada criou o voluntário para consertar escolas e unidades de saúde. Também incentivou seus partidários a criarem leis para esconder os informais atrás de programas que empobrecem os formalizados que passam a ser microempreendores individuais. Lula criou a república assistencialista e calou os banqueiros e os grandes grupos econômicos com legislações contemplativas. Dilma dá sequência.

Então... se soubermos o que a Globo difunde, segundo as questões daquela prova, temos cultura. Yes! Nóis sabe das coisas!

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